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Adotado por consenso por 176 países-membros, acordo da Organização Mundial de Propriedade Intelectual é resultado de duas décadas de negociações.

Brasil assinou o Tratado sobre Propriedade Intelectual, Recursos Genéticos e Conhecimentos Tradicionais Associados no encerramento da Conferência Diplomática da Organização Mundial de Propriedade Intelectual (OMPI), em Genebra, na Suíça, na última sexta-feira, 24 de maio.

A decisão da OMPI, entidade internacional integrante do Sistema da Organização das Nações Unidas (ONU), é o primeiro acordo do órgão a inter-relacionar propriedade intelectual com o respeito ao patrimônio genético e aos conhecimentos dos povos indígenas e comunidades tradicionais.

Presidida pelo representante permanente do Brasil juntos aos Organismos Econômicos Internacionais, a conferência é resultado de duas décadas de negociações na OMPI. O Brasil atuou para incorporar ao sistema de propriedade intelectual o respeito ao patrimônio genético e aos conhecimentos dos povos indígenas e comunidades tradicionais. Com o tratado, adotado por consenso por 176 países-membros da OMPI, solicitantes de patentes são obrigados a divulgar o acesso a recursos genéticos e a conhecimentos tradicionais associados necessários a suas invenções.

Os recursos genéticos incluem plantas comumente atreladas aos povos indígenas e comunidades locais por seu uso, conservação e tradição repassadas ao longo de gerações. Apesar dos recursos genéticos em estado natural não poderem ser diretamente protegidos como propriedade intelectual (PI), as invenções desenvolvidas usando esses recursos preenchem os requisitos para a obtenção de proteção, geralmente por meio de patente. Trata-se de uma pauta histórica de países em desenvolvimento e megadiversos no regime de propriedade intelectual, com impactos esperados sobre regimes e acordos multilaterais ambientais como CDB, Protocolo de Nagoya, TIRFAA e BBNJ.

“Hoje é um dia histórico, em muitos aspectos, não só porque é um novo tratado da OMPI em mais de uma década, mas também porque é o primeiro a abordar os recursos genéticos e o conhecimento tradicional detidos pelos povos indígenas e pelas comunidades locais. Desta forma, demonstramos que o sistema de propriedade intelectual pode continuar a incentivar a inovação e, ao mesmo tempo, evoluir de forma inclusiva, respondendo às necessidades de todos os países e das suas comunidades”, afirmou o diretor-geral da OMPI, Daren Tang.

PATENTES – Com o tratado, requerentes de patentes, cujas invenções se baseiam em recursos genéticos ou conhecimentos tradicionais associados, precisam divulgar o país de origem, a fonte original destes recursos e quais povos indígenas ou comunidades locais que forneceram o conhecimento tradicional utilizado nas pesquisas.

Uma vez que as invenções resultantes se dão em setores industriais com grande participação no mercado, como o farmacêutico, o de cosméticos, o de alimentos e outros, o acordo fortalece esforços em prol da conservação da biodiversidade ao facilitar que os benefícios gerados a partir dessas invenções sejam compartilhados com os países de origem dos recursos genéticos e com os povos e comunidades detentores do conhecimento tradicional associado.

Para Carolina Miranda, coordenadora-geral de Regulação Internacional, da Secretaria de Direitos Autorais e Intelectuais (SDAI) do Ministério da Cultura (MinC), esse é um passo histórico e inovador. “Esse tratado tem toda uma gama de normas adaptadas a essas comunidades tradicionais. É uma nova forma de olhar para a propriedade intelectual, adaptando seus conceitos para respeitar as necessidades das comunidades tradicionais e de questões como as dos povos originários”, explicou.

CONTRIBUIÇÃO PARA CIÊNCIA – O acordo é um marco no regime internacional de propriedade intelectual que traduz em ações concretas no campo econômico objetivos de proteção ambiental e promoção dos direitos humanos. O empenho do Brasil nas negociações reitera a determinação brasileira de buscar, também pela via multilateral, oportunidades de geração de emprego e renda sustentáveis para as comunidades tradicionais, apoiando a conservação das florestas e da biodiversidade.

O instrumento poderá contribuir para promover a ciência e inovação em países biodiversos, e deverá facilitar a inclusão de comunidades tradicionais na repartição dos benefícios econômicos derivados de patentes que utilizam seus saberes e costumes. A julgar pela experiência brasileira (no País, os solicitantes de patentes já são obrigados a revelar essa informação), os benefícios do acordo também poderão ser sentidos por países sede das indústrias que utilizam recursos genéticos e conhecimentos tradicionais associados. Segundo o INPI, desde 2015, quando entrou em vigor a Lei da Biodiversidade, o número de solicitações de patentes que utilizam recursos genéticos e conhecimentos tradicionais associados aumentou consideravelmente, indicando incentivo à inovação.

Além do Ministério das Relações Exteriores, a delegação brasileira incluiu o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, o Ministério dos Povos Indígenas, o Ministério da Justiça e o Instituto Nacional da Propriedade Industrial, e teve a participação de representantes de povos indígenas de diferentes biomas.

O compromisso brasileiro para a conclusão do tratado foi amplamente reconhecido na sua escolha para presidir a Conferência Diplomática, e sinaliza a percepção internacional sobre o relevante papel do país como facilitador de soluções consensuais por avanços na agenda global, mantendo vivo, ao mesmo tempo, o espaço do multilateralismo econômico.

Fonte: Secretaria de Cultura